Uma resolução que deve ser aprovada nesta segunda-feira pelo Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) vai permitir que casais estrangeiros ou
brasileiros residentes no exterior sejam incluídos no Cadastro Nacional
de Adoção (CNA). O objetivo é aumentar as adoções de crianças com mais
idade e também de grupos de irmãos.
O texto foi preparado após mais de um ano e meio de discussões. A
expectativa de conselheiros e especialistas na área é de que seja
aprovada. Dados atualizados do cadastro nacional mostram que há mais de
30 mil pretendentes a adotar e 5,4 mil crianças aptas à adoção. Os
números levariam a crer que todas as crianças seriam adotadas, mas a
realidade é outra.
Cerca de 98% dos pretendentes à adoção no país querem crianças com
menos de 7 anos de idade. Só que as crianças nessa faixa etária são
menos de 10% das disponíveis para a adoção. A grande maioria dos que
procuram um lar são crianças e adolescentes entre 9 e 16 anos. Outro
dado indica que 75% dos jovens que esperam ser adotados têm irmãos
também disponíveis para adoção. E a Justiça sempre busca que eles sejam
adotados juntos para não perderem o vínculo familiar. Entre os
pretendentes, 80% querem adotar uma única criança.
Para o conselheiro do CNJ Guilherme Calmon, que coordena o grupo de
cooperação jurídica internacional do Conselho, a relação entre crianças
disponíveis e pretendentes no cadastro "não se encaixa". Segundo ele, a
inclusão de estrangeiros visa permitir que mais crianças tenham uma
família. "As crianças mais velhas, grupos de irmãos, estão num perfil
daqueles que não são procurados. E o perfil de criança que o estrangeiro
quer adotar não é o mesmo do pretendente nacional", diz Calmon.
A lei brasileira já permite que estrangeiros adotem crianças
brasileiras. Atualmente, essas adoções ocorrem diretamente nos tribunais
estaduais, sem passar pelo cadastro nacional. "A adoção internacional é
exceção da exceção. O ideal é que a criança fique na sua família
natural, e a adoção já é uma exceção. Mas verificamos que o cadastro não
serve para a adoção internacional. Então, precisamos atualizar para
permitir que mais crianças sejam favorecidas. Temos inúmeros casos de
crianças que não são adotadas, ficam mofando nos abrigos e chega uma
idade que ninguém mais quer saber de adotar", destaca.
Especialistas preveem melhorias
A advogada Nádia de Araujo, especializada em Direito Internacional e
que atua na área de adoção, concorda que os estrangeiros são mais
abertos que os brasileiros. "Acho que vai dar transparência para a
adoção internacional e facilitar a adoção de crianças cujo perfil os
casais residentes no Brasil não querem", destaca Nádia. Presidente da
Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), Suzana
Schettini destaca que a partir de agora será possível saber onde os
estrangeiros adotam as crianças. "Ficava sempre na obscuridade. Isso vai
dar transparência e permitir o cruzamento de dados. Os estrangeiros são
mais abertos a grupos de irmãos e até crianças com deficiência." O
desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco Luiz Carlos
Figueiredo participou dos debates no CNJ e concorda que a medida será
positiva. Ele destaca que, antes do cadastro nacional, não se tinha
informação sobre se o estrangeiro era ou não favorecido ante
brasileiros. Isso vai dar transparência, e as adoções internacionais
podem voltar a subir.
Principais destinos são Itália e França
Para adotar uma criança, o estrangeiro atualmente se habilita em seu
país por intermédio de uma entidade credenciada pela Autoridade Central
Administrativa Federal (Acaf), ligada à Secretaria de Direitos Humanos
da Presidência da República do Brasil. Passa por uma preparação e envia a
documentação para as Comissões Estaduais Judiciárias de Adoção, que
tentam localizar as crianças. Depois que o juiz analisa o caso e permite
a adoção, é iniciado o procedimento de emissão de passaporte para o
adotado. O casal estrangeiro ou residente no exterior precisa ficar um
mês com a criança no Brasil sob supervisão.
A Acaf acompanha a adoção por mais dois anos. Segundo o
coordenador-geral da Acaf, George Lima, em 2013 cerca de 300 crianças
foram adotadas no Brasil. Os principais destinos foram Itália e França.
Lima diz que o governo espera que o CNJ aprove a inclusão dos
estrangeiros no cadastro nacional. "A criança, quando vai para adoção,
passa por um processo de destituição do poder familiar. Não queremos
incentivar a adoção internacional, mas permitir que mais crianças tenham
uma família."
* Correio do Povo
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