Quatro vereadores de Bento estariam se apropriando de até dois terços
dos salários de assessores
Os valores, de até dois terços da remuneração, seriam sacados dos
vencimentos mensais diretamente em caixas bancários ou retirados por
empréstimos, que tinham prestações assumidas pelas vítimas. Entre as
provas obtidas pelo MP, estão a quebra judicial de sigilos bancários de
vários assessores e investigados, além de depoimentos de servidores que
estão na ativa, gravações ambientais, documentos e mensagens trocadas
via Facebook. “Houve um vasto rol de provas, imprescindível em casos
como esses, em que elas são muito difíceis de obter. Por conta dessa
necessidade, o Inquérito Civil teve a duração de quatro anos, sendo
preferível a demora na sua conclusão a uma ação apressada”, explica
Nogueira.
Na última terça-feira, dia 13, a juíza Romani Terezinha Bortolas
Dalcin, da 3ª Vara Cível, acatou o pedido da promotoria de bloquear bens
dos quatro vereadores denunciados. Nos casos de Cainelli, Barbosa e
Santos, a interdição vai até o limite de R$ 270 mil para cada um. Para
Marlen, fica em R$ 200 mil. Também foi determinada a quebra dos sigilos
fiscal e bancário de Ari Pelicioli, Sérgio Panizzi e Iraci Manfroi, três
das quatro pessoas que podem estar ligadas ao esquema. A decisão da
magistrada, entretanto, não contemplou o afastamento dos políticos de
seus cargos, e estabeleceu que o processo passa a tramitar em segredo de
Justiça.
Para o promotor Nogueira, há indícios de que a prática ainda continue
ocorrendo no Legislativo municipal. “Há casos mais antigos e casos bem
mais recentes. Por isso, não temos razão para crer que os fatos
ocorreram apenas num período delimitado, até porque o próprio tipo de
esquema pressupõe a sua continuidade”, argumenta o representante do MP.
“Era coisa de R$ 30 mil, R$ 40 mil”, diz ex-assessora
Uma das testemunhas ouvidas pelo MP, em pelo menos duas ocasiões,
relatou ao SERRANOSSA como funcionava o esquema em um dos gabinetes.
Segundo a vítima, assim que foi contratada, com salário superior a R$
3,7 mil, ela foi informada que teria duas opções: receber apenas R$ 1
mil e mais R$ 200 em vale-refeição ou receber diretamente o total de R$
1,2 mil – nas duas alternativas, ela ficaria somente com um terço dos
seus vencimentos. A justificativa apresentada na ocasião era a
necessidade de pagar outros funcionários, inclusive da bancada do
partido.
Como acreditou na suposta destinação do montante, a mulher aceitou o
combinado. Entretanto, alguns dias depois, ao saber que os servidores
eram efetivados – e, portanto, já pagos pela Câmara de Vereadores –, ela
se negou, já no primeiro salário recebido, a repassar o dinheiro. “Eu
fiquei sabendo que o dinheiro não seria para esses funcionários. Então,
não quis pagar e me mandaram embora. Disseram que eu não cumpri o
acordo”, conta a informante, que em função da negativa trabalhou menos
de um mês na Casa.
Mesmo assim, ela garante que a cobrança era conhecida por todos no
gabinete e tinha, como indicado pela promotoria, participação de pessoas
de fora. “Sempre tinha um terceiro que recolhia o dinheiro, mas na hora
em que falaram sobre isso comigo estavam todos na sala”. Além disso, a
testemunha confirma que também era oferecida a possibilidade de que os
assessores fizessem um empréstimo, que seria pago por eles em parcelas
mensais de valor elevado. “Não era empréstimo pequeno, era coisa de R$
30 mil, R$ 40 mil. Era uma forma de garantir que eles iam receber e
também chamaria menos atenção”, completa.
O que dizem os vereadores
Adelino Cainelli (PP): em nota repassada à imprensa, Cainelli
diz estar “do lado da justiça e à disposição para contribuir com o que
for necessário”. “Estou tranquilo e, no decorrer do processo, a
inocência vira à tona”, destaca um trecho do comunicado.
Marcos Barbosa (PRB): também em nota, o advogado do vereador
afirma que o parlamentar está sendo “vítima de uma injustiça cortante,
áspera e cruel”. “O bom trabalho realizado pelo vereador junto à
comunidade local, com duas votações recordes, tem contrariado interesses
políticos que desejam frear à sua notável ascensão”, diz uma parte do
texto enviado por e-mail.
Marlen Pelicioli (PPS): “Ainda não vou me manifestar porque não recebi citação nenhuma. O que eu soube até agora foi somente pela imprensa”.
Vanderlei Santos (PP): afirma não ter conhecimento do
processo. “Dessa forma, ao não saber quais são as acusações, se torna
prematuro falar agora”, justifica Santos, que garante estar “aguardando
receber a intimação e bem tranquilo” quanto à defesa. Ele aponta ainda
que, no mês de abril, esteve na promotoria para responder alguns
questionamentos.
Como funcionava o esquema
Ao assumirem os cargos em gabinetes onde o esquema funcionava, os assessores tinham duas alternativas, segundo o MP:
Ao receber o salário, o funcionário entregaria, geralmente a alguém
ligado ao vereador, até dois terços dos vencimentos a que teria direito.
A outra opção apresentada ao servidor seria contrair um empréstimo em
seu nome, que depois teria descontos mensais. As quantias, entregues
integralmente aos gerenciadores do esquema, alcançariam valores como R$
30 mil.
Reportagem: Jornal SerraNossa - Jorge Bronzato Jr.
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