RIO - Há pouco mais de quatro meses, Jorge Mario Bergoglio era eleito
para ocupar o trono de São Pedro em Roma e se tornou Francisco, mas foi
no Rio que ele despontou como papa. Em uma semana no Brasil, o santo
padre esclareceu ao mundo seus planos para a Igreja, reconheceu as
"incoerências" da instituição e não deixou de criticar sacerdotes e
bispos. Aos jovens, os alertou que não poderiam "lavar as mãos" diante
dos problemas atuais do mundo.
Em uma semana no Brasil, o santo padre esclareceu ao mundo seus planos para a Igreja
Às classes dirigentes e aos políticos, a mensagem foi especialmente
dura. O papa atacou a corrupção, pediu que os pobres fossem ouvidos e
que os governos sejam responsáveis por toda a sociedade.
Foi o banho de multidão, no entanto, e, acima de tudo, o impacto de
suas mensagens que passaram a dar um conteúdo a seu pontificado e marcar
uma nova realidade no Vaticano: o "governo" de Bento XVI acabou e são
as ideias de Francisco que vão marcar o ritmo agora da Santa Sé.
Ao desembarcar no Rio, após 12 horas de voo sem dormir um só minuto,
Francisco dava passos cuidadosamente calculados, o que se refletiu em
discursos moderados, sem improvisação. Não demorou para que ele
começasse a soltar seus ataques frontais às injustiças e não tivesse
qualquer complexo em reafirmar dogmas. Não ficariam dúvidas: a forma e
os gestos são novos. A prioridade com os pobres é nova, mas não o
Evangelho. Os dogmas da Igreja foram reafirmados, mas não como ameaças.
Pessoas próximas ao papa contam que ele mesmo se dava conta da
dimensão da viagem e do cargo ao longo da semana. Seu discurso ganhou
uma dimensão internacional e as multidões que atraiu para a Praia de
Copacabana impressionaram os mais experientes cardeais. Fontes do
Vaticano confirmaram ao Estado que o papa chegou a chorar durante a viagem por causa da emoção.
Um dos aspectos que chamou a atenção de seus assessores foi sua
vitalidade. Por anos, o Vaticano e os fiéis se acostumaram à imagem de
um papa velho ou doente. Agora, se em diversas vezes o palco e o púlpito
foram seu teatro, foi sobre o papamóvel aberto que uma parte
substancial de sua missão ocorreu. "Ele estava acostumado apenas a
trajetos curtos na Praça São Pedro e, por isso, sentiu um pouco quando
chegou ao Rio. Logo gostou da ideia", brincou um de seus assessores.
De cima do carro, ele bebeu chimarrão, era alvo de centenas de
bandeiras e mexia de um lado ao outro. Para o papa, o momento mais
importante de sua viagem foi sua presença numa favela, revelam seus
assessores. Fez o que sempre fazia em Buenos Aires, mas, desta vez,
visto pelo mundo todo. O Vaticano não nega: a viagem marca um ruptura de
fato entre os pontificados de Bento XVI e Francisco.
Após a missa deste domingo, um de seus assistentes comentou com o
papa que a viagem já estava chegando ao fim e ouviu, como resposta, algo
tipicamente de um santo padre que sabe que não tem tempo a perder. O
Rio, segundo ele, era só o início de um caminho. Porém, tanto Francisco
quanto o Vaticano sabem: o caminho da reforma será dos mais difíceis e
não há qualquer garantia de que os fiéis serão resgatados e que a Igreja
voltará a ser ator importante na sociedade.
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