O Projeto de Lei nº 2.126/2011, conhecido como Marco Civil da Internet,
entrou na pauta da reunião de líderes da Câmara dos Deputados como um
dos que devem ser votados no próxima terça-feira (11). O projeto tramita
em conjunto com o Projeto de Lei 5.403/2001 e outras 38 proposições, e
encontra-se em regime de urgência. Isso permite que seja incluído na
ordem do dia para discussão e votação imediata.
Nos últimos anos, a votação do projeto foi adiada por várias vezes. O
motivo do adiamento das votações seria a falta de consenso em torno do
tratamento dado à neutralidade de rede no texto do substitutivo
elaborado pelo deputado federal Alessandro Molon (PT/RJ), relator do
projeto na comissão especial criada para sua apreciação.
A neutralidade da rede é um princípio fundantal da internet e
corresponde à obrigação, a todos os envolvidos na transmissão de dados,
de tratarem todas as informações de forma igualitária e sem
discriminações, com exceção daquelas fundadas em requisitos técnicos
indispensáveis à adequada utilização de serviços.
A proposta, tida por muitos como uma verdadeira “constituição da
internet”, foi elaborada pelo Ministério da Justiça a partir de um amplo
debate público realizado pela própria rede.
“O marco civil da Internet é o exemplo mais bem sucedido de construção
participativa que temos nos últimos anos. O debate público em torno do
tema recebeu mais de 2 mil contribuições. Graças a essa participação
conseguimos elaborar um texto em plena harmonia com as diversas demandas
dos usuários da Internet em nosso país”, afirma Marivaldo Pereira,
Secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça.
O que é o Marco Civil da Internet?
O Projeto de Lei nº 2126/2011, também conhecido como “Marco Civil da
Internet”, pretende, dentro do contexto do Estado brasileiro,
estabelecer regras mais claras a respeito dos direitos, deveres,
garantias e princípios para o uso da Internet no Brasil. A proposta
delimita deveres e responsabilidades a serem exigidos dos prestadores de
serviços e define o papel a ser exercido pelo poder público em relação
ao desenvolvimento do potencial social da rede.
Para que a internet seja preservada como um espaço dinâmico e de
colaboração, qualquer iniciativa de regulamentação da Internet deve
observar tanto os princípios constitucionais (como a liberdade de
expressão, a privacidade do indivíduo, o respeito aos direitos humanos)
quanto os princípios que estruturam o funcionamento da rede. No entanto,
muitas interpretações judiciais têm desconsiderado os princípios
constitucionais e a arquitetura da Internet. Com o intuito de resolver o
impasse, o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) editou, em
2009, um documento com “Diretrizes para o uso e governança da Internet
no Brasil”. Estas diretrizes apresentam 10 princípios fundamentais para a
regulação da Internet, de forma harmônica com os valores
constitucionais, para assegurar seu adequado funcionamento tanto
tecnológico como social. Junto aos princípios e garantias
constitucionais, essas diretrizes formam as bases principiológicas do
Marco Civil.
Além de traçar diretrizes para a regulação da internet no país, o Marco
Civil também traz uma uniformização de conceitos relacionados à rede,
para harmonizar a interpretação dos aspectos tecnológicos e facilitar a
regulamentação de matérias afins. Ainda, estabelece algumas regras,
deveres e responsabilidades aos diversos atores da rede.
Dentre elas, destacam-se as questões relacionadas à privacidade do
usuário. Além da garantia da inviolabilidade das comunicações e da
proteção dos dados pessoais, o marco civil também propõe limitações e
regras claras para a guarda de registros de internet (os chamados logs,
que permitem identificar os usuários e suas atividades na rede). Como
regra geral, estes registros só podem ser fornecidos a terceiros
mediante ordem judicial – ou, em alguns casos, mediante prévia
autorização do usuário a quem se referem.
Outro ponto relevante é a neutralidade da rede – que corresponde ao
princípio de que os pacotes de dados que trafegam entre os usuários
devem ser tratados de forma igualitária, sem discriminação quanto à sua
origem, destino, aparelho, serviço utilizado ou conteúdo. Esta garantia
tem o objetivo tanto de proteger os consumidores com relação à prejuízos
injustificados nos serviços quanto garantir a adequada concorrência
entre os diversos prestadores de serviços.
Um terceiro ponto importante é a criação de regras de isenção de
responsabilidade com relação ao conteúdo postado por terceiros. Nos
últimos anos, grande parte do desenvolvimento da internet como
ferramenta de comunicação partiu da lógica de que qualquer usuário pode
interagir livremente, publicando ou editando textos, comentários, vídeos
e fotos em sites variados gerenciados por empresas ou por outros
usuários. Estabelecer de antemão que todos os sites seriam responsáveis
pelos danos causados por qualquer conteúdo postado por um visitante
levaria a internet a um fechamento indesejável: o custo ou o risco de
fornecer estes serviços levaria ao fechamento de incontáveis blogs e
serviços de comunicação. Este é um tema que o marco civil busca
regulamentar, em defesa da liberdade de expressão.
Por fim, o marco civil traz ainda um conjunto de diretrizes para a
atuação do poder público na organização e no gerenciamento da internet.
Além de atuar na promoção do acesso a todos os cidadãos, cabe aos
governos também utilizar a rede para prestar serviços, garantir mais
transparência nas informações públicas, e utilizar-se das tecnologias de
forma adequada para o aperfeiçoamento da gestão pública.
O que muda na sua vida com a aprovação do Marco Civil da Internet?
O Marco Civil não vai regulamentar o funcionamento técnico da Internet.
Ele objetiva regular apenas o uso da Internet no Brasil do ponto de
vista jurídico e civil, estabelecendo direitos e responsabilidades dos
usuários no uso da Internet.
A Internet funciona segundo protocolos definidos por entidades
internacionais que fazem a chamada governança da Internet. Estas
entidades definem, geralmente por consenso e em foros técnicos
internacionais, os requisitos e padrões técnicos relativos ao
funcionamento da rede. O Marco Civil não vai interferir nisso, pois não
fixa nenhuma mudança com relação aos protocolos técnicos de
funcionamento da Internet.
Se o PL 2126/2011 for aprovado, os usuários passarão a ter direitos e
garantias mais claras com relação à sua privacidade. O Marco Civil traz
como princípio da utilização da Internet a proteção da privacidade e dos
dados pessoais do usuário, e traz também uma série de direitos
relacionados à proteção dos dados pessoais. O texto reconhece o direito
do usuário à inviolabilidade de suas comunicações e ao sigilo de seus
registros na Internet, salvo mediante decisão judicial.
O marco civil também permitirá que alguém que se sinta prejudicado por
alguma ofensa ou crime praticado por meio da internet busque, por via
judicial, os registros necessários para a identificação do autor da
ofensa ou do delito.Para que o pedido seja aceito pelo juiz, o Marco
Civil exige que o interessado comprove, além da utilidade e pertinência
do pedido, haver fortes indícios da prática do ilícito. Além disso, o
pedido deve ser específico e limitado a um período no tempo.
O marco civil trará também regras mais claras sobre a possibilidade de
remoção de conteúdo postado por terceiros em sites, blogs e redes
sociais. Na redação proposta, aquele que hospeda um comentário somente
será considerado responsável civilmente (ou seja, somente terá o dever
de indenizar por danos causados) caso venha a descumprir uma ordem
judicial que determine a remoção de determinado conteúdo. Esta medida
busca proteger a liberdade de expressão e evitar a censura, ao minimizar
a possibilidade de que estes sites venham a remover conteúdos por meio
de intimidações extrajudiciais.
* Ministério da Justiça